Brasil não pode perder a corrida da modernização trabalhista

O mundo vive uma transformação acelerada. A revolução digital, a inteligência artificial, a transição energética e a reorganização das cadeias de produção estão alterando a forma de trabalhar, produzir e competir. Países que não acompanham esse ritmo perdem espaço globalmente. O Brasil não está imune a essa realidade. Se quisermos prosperar, precisamos modernizar nossas instituições na mesma velocidade em que o mundo se moderniza. O desafio, nesse sentido, não é reconhecer a urgência, mas garantir que nossas instituições estejam à altura das transformações.

A reforma trabalhista de 2017 mostrou como uma atualização legislativa pode mudar realidades. Ao dar clareza a regras que antes alimentavam disputas intermináveis, reduziu a incerteza, fortaleceu a negociação entre empresas e trabalhadores e liberou recursos que estavam aprisionados na engrenagem da litigância excessiva. Só entre 2022 e 2024, a economia foi de cerca de R$ 15 bilhões. Ainda assim, parte dos avanços poderia ter sido maior, não fosse a falta de consolidação legislativa e interpretações judiciais que vêm abrindo brechas para novas inseguranças. A lei cumpriu seu papel, é fato; é a aplicação dela que precisa ser fortalecida.

Questões como terceirização, negociação coletiva e horas de deslocamento, que antes alimentavam litígios sem fim, foram pacificadas pela reforma. A Justiça passou a ser menos sobrecarregada e mais efetiva, com milhares de conflitos resolvidos diretamente entre as partes. Cresceu também a busca por acordos extrajudiciais, prova de que, com previsibilidade, empresas e trabalhadores preferem o diálogo ao litígio.

Esse processo, no entanto, sofreu um revés em 2024, quando mudanças na interpretação das regras de gratuidade estimularam a chamada litigância predatória. Foram mais de 2 milhões de novas ações apenas em um ano, sinal  de que retrocessos institucionais cobram caro e exigem atenção redobrada. Cada brecha aberta representa bilhões desperdiçados, investimentos represados e empregos que deixam de ser criados.

É neste ponto que o debate deixa de ser jurídico e passa a ser estratégico. O Brasil convive com um Custo Brasil de R$ 1,7 trilhão por ano que mina nossa competitividade. A reforma mostrou que é possível reduzir esse fardo, mas também evidenciou como decisões inconsistentes podem devolvê-lo ainda maior. Sem previsibilidade, não há investimento. Sem investimento, não há emprego.

Por isso, a modernização trabalhista deve ser vista como uma engrenagem coletiva. Para os trabalhadores, regras claras significam mais segurança nas relações de trabalho e maior estabilidade para planejar sua vida. Para a economia, mais investimentos produtivos, inovação e geração de empregos de qualidade. Para o Estado, uma Justiça menos sobrecarregada e mais eficiente. E, para a sociedade , significam uma economia mais dinâmica, produtiva e inclusiva. Modernizar é, acima de tudo, criar confiança mútua.

Quando há previsibilidade, todos avançam. O empregador assume riscos com mais tranquilidade, o trabalhador atua com mais proteção, e o país reduz custos desnecessários que travam sua competitividade. Ao contrário do que muitas vezes se insinua no debate público, modernizar não significa precarizar, mas garantir que as transformações no mercado de trabalho ocorram dentro de marcos estáveis e equilibrados. Não se trata de estimular vínculos frágeis ou incentivar a chamada “pejotização” indevida, mas de consolidar um sistema que permita relações legítimas sem zonas cinzentas que só alimentam litígios. O verdadeiro risco para trabalhadores e empresas está na instabilidade jurídica, que desorganiza o mercado e corrói oportunidades.

Estudo do Movimento Brasil Competitivo (MBC), Confederação Nacional da Indústria (CNI) e Fundação Getulio Vargas (FGV) mostra que, se o país retomar a trajetória de previsibilidade, a sociedade pode se beneficiar de uma economia adicional de R$ 10,9 bilhões até 2027 — recursos que deixam de ser desperdiçados em disputas e passam a fortalecer o desenvolvimento. Esse potencial exige coragem política e responsabilidade institucional: ao Legislativo cabe consolidar os avanços já aprovados, e ao Judiciário cabe aplicar a lei como foi definida pelo Congresso. Quando o Judiciário extrapola sua função e passa a reinterpretar ou legislar por conta própria, gera insegurança, desequilibra relações e cria custos que o Brasil não pode mais suportar. Segurança jurídica só existe quando cada Poder cumpre sua função.

Defender a modernização trabalhista é proteger uma conquista coletiva. É garantir que a Justiça cumpra sua função essencial, sem ser sufocada por disputas que poderiam ser resolvidas com clareza e bom senso.

Oito anos depois, a lição mostra que enfrentar gargalos estruturais com coragem se tangibiliza em ganhos bilionários. Ou seguimos na rota da modernização, ampliando o espaço para o diálogo, a previsibilidade e a competitividade, ou ficaremos presos ao peso do passado. O Brasil precisa continuar modernizando com velocidade.

*Ricardo Alban, presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI)

*Jorge Gerdau, presidente do Conselho Superior do Movimento Brasil Competitivo (MBC)

O artigo foi publicado no jornal O Estado de São Paulo, no dia 20 de outubro de 2025.

Fonte: CNI | Autorizada a reprodução desde que citada a fonte.